A homologação de sentenças estrangeiras é um ato de cooperação judicial de extrema importância em um mundo cada vez mais conectado. Pessoas mudam de país constituindo famílias e contraindo direitos e obrigações em novas jurisdições, empresas abrem filiais em outros continentes e o mundo vai se tornando cada vez menor, porém, é preciso, desde já, esclarecer que cada país tem suas leis e que estas não são necessariamente uniformes. É nesse contexto que é aplicado o ato judicial de homologação. Ele tem como objetivo permitir que uma das partes, que obteve uma sentença julgada por tribunal estrangeiro, possa garantir a satisfação de seu direito em território nacional sem necessidade de iniciar um novo processo desde que atendidos certos pressupostos. Considerando que as regras em relação ao sistema judiciário e as leis de cada país diferem entre si, o controle é necessário a fim de garantir que a sentença estrangeira seja válida e exequível no país.
A Convenção de Sentenças de Haia está em vigor desde setembro de 2023 e tem como objetivo uniformizar as regras para o reconhecimento e a execução de sentenças estrangeiras entre os Estados que a ratificaram em questões relativas à matéria civil ou comercial, ressalvadas as exceções previstas no próprio texto da convenção. Vários países já ratificaram a convenção, porém, até o momento, o Brasil ainda não aderiu. Isso não significa dizer que o país seja avesso ao reconhecimento de sentenças estrangeiras; muito pelo contrário, apenas em 2018, mais de 2030 sentenças estrangeiras foram analisadas.
No Brasil, a competência para o ato de homologação é do Superior Tribunal de Justiça, com base no art. 105 da Constituição Federal.[1] E o procedimento segue as regras definidas no Código de Processo Civil e no Regimento Interno da Corte. São necessários os seguintes requisitos, dentre outros: ter sido proferida por uma autoridade competente, ser precedida de citação, ser uma decisão definitiva no país em que foi proferida, não ofender a soberania nacional – casos de competência absoluta da autoridade judiciária brasileira como imóveis situados no Brasil ou que sejam incompatíveis com as normas fundamentais que regem o Estado brasileiro – a dignidade da pessoa humana ou a ordem pública. Dados esses requisitos, a sentença poderá ser homologada total ou apenas parcialmente. E não só as sentenças judiciais, mas também as sentenças arbitrais estrangeiras também devem ser homologadas e prestigiar o devido processo legal para serem declaradas válidas e exequíveis. Também é possível que uma sentença arbitral estrangeira possa não ser homologada por ofender a ordem pública, FATO OCORRIDO na SEC 9.412/EX[2].
Em relação à forma de citação, há casos em que a jurisprudência do STJ flexibilizou a regra da carta rogatória, como nas situações em que a parte está domiciliada no Brasil. A decisão mais recente ocorreu na HDE 8123 – caso em que a citação de uma empresária, domiciliada no Brasil, se deu por Whatsapp – havendo ainda outras situações em que a carta rogatória foi dispensada, citando-se alguns: HDE 144/2019 e HDE 896.
Comparando as disposições contidas na Convenção de sentenças da HCCH e o procedimento brasileiro, encontramos as seguintes similaridades: o respeito com o devido processo legal e o contraditório, a existência de requisitos formais, como a necessidade da cópia integral, a tradução, salvo em caso de dispensa, e a definitividade da decisão. Em relação à possibilidade de o Estado não realizar a homologação, apesar de a ordem pública e a soberania nacional serem pontos de coincidência entre as duas normas, a Convenção traz outras hipóteses, esclarecendo, ainda, as hipóteses de competência do tribunal e as hipóteses em que a autoridade do país de origem pode não ser reconhecida.
Apesar da receptividade brasileira no que tange ao processo de reconhecimento de sentenças estrangeiras, a adesão à convenção seria uma importante medida de facilitação e circulação de sentenças brasileiras no exterior. Isso, principalmente, se levarmos em consideração que a receptividade a decisões estrangeiras pode não ser a mesma em outros países e,ainda, gerar maior previsibilidade aos negócios jurídicos transnacionais.
[1] SUPERIOR TRINUNAL DE JUSTIÇA. Homologação de Sentença Estrangeira. STJ: Brasília, s.d. Disponível Neste Link.
[2] SEC 9.412/EX, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORTE ESPECIAL, julgado em 19/04/2017, DJe 30/05/2017.